sábado, 31 de maio de 2008

Sr.F, o atraso, a tempestade e o ataque

(ao som de Riders on the Storm ) - The Doors


Nesta manhã Sr.F saiu de casa já atrasado para ir á escola, ficou até tarde fazendo um trabalho e acordar – ainda mais com o frio que fazia – foi um verdadeiro sacrilégio que lhe custou muitos minutos.

Estava chovendo torrencialmente, de pouco adiantava a proteção no guarda-chuva, o sobretudo de Sr.F logo encharcou. Trovões seguidos e relâmpagos assustavam a população impaciente. Sr.F teve muita dificuldade de atravessar a rua pois uma boca de lobo entupida provocou uma verdadeira enxurrada que começava na sarjeta e ia até o meio da rua, Sr.F teve que prolongar seu caminho por três quadras, dando uma longa volta para chega ao seu destino.

Chegando ao ponto seu ônibus logo chegou e,quando Sr.F se preparava para passar pela catraca, o ônibus deu uma freada ( nada de muito brusco, nem veloz estava o ônibus, foi apenas para parar no semáforo ) e uma mulher se desequilibrou. Era uma mulher negra, estatura mediana, cerca de 40 anos, com uma bolsa pequena em seu ombro esquerdo.

Lentamente ele foi caindo para traz e prontamente dois passageiros tentaram ajuda-la. Sem encostar no chão ou em qualquer lugar a mulher de repente estatelou seus olhos, como se uma adaga tivesse sido enfiada em suas costas atingindo o coração. Os dois passageiros então a soltaram assustados, a mulher já inconsciente caiu no chão frio do ônibus se contorcendo por inteira.

Seus músculos enrijeceram e seus braços e pernas ficaram duros, sua cabeça virou de lado. Com dificuldades para respirar tossia, gemia e babava os passageiros apavorados não sabiam o que fazer, o cobrador saiu de sua cabine para tentar ajudar.

Sr.F e outros passageiros tentavam procurar algo para fazer, foram muitas as sugestões, reclamações e exclamações:

Passageiros:

- “Pega a língua dela, não deixa enrolar”!

- “Coloca alguma coisa na boca dela, pega uma blusa!”

- “Abre a janela, dá espaço!”.

- “isso pega?”

- “Liga para o 192”

- “Era só o que me faltava...”.

- “Corre pro hospital motorista”

- “Não, para o ônibus, ela pode bater a cabeça”.

- “Ergue as pernas dela”

- “Só protege a cabeça dela gente, pelaoamordedeus...”.

Não é colocado nada em sua boca, ninguém tenta pegar sua língua. Sua cabeça fica na lateral, deixando a baba escorrer, sem controle ela elimina urina, sem saber os passageiros agiram certo. Aos poucos a respiração vai ficando normal, suas pernas e seus braços relaxam, ela repousa. O ônibus está perto de um hospital e é para lá que o motorista vai levá-la. Ele ainda para em um ponto causando a revolta dos passageiros que o xingam mandando ele ir correndo para o hospital.

São poucos minutos, mas que parecem uma eternidade, os semáforos estão todos vermelhos, a chuva não cessa. A tempestade está tão forte que o motorista mal consegue ver o que está dez metros a sua frente, o vento é muito intenso e faz um barulho assustador. Com dificuldades, finalmente o ônibus chega perto do hospital e para, ao lado de um outro ponto. Dois passageiros correm para buscar ajuda. Um médico aparece mestiço, com traços orientais, mais novo do que a maioria dos passageiros ele atende a mulher, agacha e tenta conversar com ela que já está se recuperando ainda.

Médico - A senhora está bem?

Mulher - (com aparência tranqüila, falando manso) Sim, estou. Onde eu ?

Médico - A senhora passou mal, a gente que ter que te examinar.

Mulher - Não moço, não precisa não, eu bem.

Médico - Quantos anos a senhora tem?

Mulher - Quatro. (se levanta com a ajuda do médico)

Médico - A senhora tem algum documento?

Mulher - Não, não tenho não senhor.

Passageiro – Ela não está bem, teve uma convulsão, um ataque, sei lá.

Médico - Vamos levar ela pro hospital

Nesse momento aparecem dois homens com capas de chuva entrando no

ônibus com uma maca.

Médico - A senhora tem alguma doença?

Mulher - Eu...eu não.

Médico - Bom senhora a gente vai ter que te examinar, por favor venha com a gente.

Mulher - Não moço, não precisa, eu não vou.

Sr.F - Senhora, eles só vão te examinar, a senhora pode ter tido um derrame, precisa

saber.

Médico - Vem senhora, a gente não vai te machucar.

Mulher - Não, vai motorista pode ir embora, eu bem...

E esta tentativa de convencer a mulher a ir para o hospital se segue até que o médico e o motorista entram no acordo que ele vai precisar levar o ônibus até a porta do pronto-socorro e sem passageiros talvez a mulher aceite que a examinem.

Os passageiros então saem do ônibus, alguns se abrigam no ponto final que estava próximo, lá algumas pessoas tem o descaramento de reclamar da mulher, achando que nada de sério havia acontecido naquele ônibus, como outros – alguns deles que estavam no ônibus – só conseguiam enxergar que aquele episódio estava atrasando-os.

Sr.F não se conformava com aquilo, seguiu com os outros passageiros, mesmo na tempestade, para o ponto onde passaria o ônibus que eles precisavam. Claro que comentavam sobre o acontecido, algumas pessoas realmente se importaram com a situação, outras estavam mais preocupadas com seu próprio mundo onde é desagradável um fato como aquele, provavelmente irão apagar da memória logo. Sr.F não.

Sobre o Texto:

Esse fato realmente aconteceu, claro que mudei alguma ou outra coisa, dei mais dramaticidade principalmente na hora da chuva, que se transpormou em tempestade.
Quanto ao acontecido, o ataque epilético, existem muitos mitos sobre ele. Primeiramente não é contagioso, não precisa se afastar da pessoa quando ela está tento o ataque. E o procedimento mais correto para ajudar a pessoa é cuidar para que ela não bata a cabeça ou se machuque quando se debater e colocar a cabeça de lado, para que a baba escorra. Não se deve tentar segurar a língua da pessoa ou colocar uma toalha entre seus dentes, isso é uma lenda que foi disseminada e é ruim para a pessoa que está tendo o ataque. Ninguém consegue engolir a própria língua, o principal risco de morte em ataques epiléticos é a pessoa bater a cabeça enquanto se debate.
Portanto, se vocês se depararem com esta situação, nada de segurar a língua, tentem manter a calma e fazer o que foi falado acima e que foi o que sem saber a gente fez no caso que aconteceu.

Quanto a música citada, Riders on the Storm é uma das mais conhecidas do Doors, tem um clima todo especial criado nela, vou passar o link para o albúm oficial da trilha sonora do filme Doors.
The Doors – Original Movie Soundtrack - senha = Thrill

quarta-feira, 28 de maio de 2008

A pior dor


Sr.F está entre amigos no trabalho. É fim de expediente, as pessoas começam a se arrumar para ir embora e confraternizar. Um dos funcionários mais apressados, já vestido com seu casaco pergunta:

Funcionário apressado – Alguém sabe da nova recepcionista? Porque ela não veio hoje?

Secretária – Sentiu falta das pernas dela né safado... Ela está doente.

Estagiário – E o que ela tem?

Secretária – Parece que é alguma coisa no rim.

Advogada – No rim? Tadinha... É a pior dor que existe.

Funcionário apressado – é mesmo... Será que ela precisa de uma massagem?

Secretária – Pelo amor de Deus, fecha essa boca, é sério, ela deve estar sofrendo,
coitada.

Segurança do prédio – Olha eu já ouvi dizer que a pior dor que existe é a que a mulher
sente no parto.

Advogada – Mas hoje ela toma um monte de anestesia nem sente nada... Duro é
enxaqueca que nenhum remédio resolve.

Estagiário – Dor de barriga também é horrível, é a que mais atrapalha.

Arquivista – Não sei não, dor de ouvido para mim é a que mais te deixa incomodado.

Funcionário que está se aposentando – Dor nas costas é que é ruim viu. Você não
consegue fazer nada direito, interfere em tudo.

Funcionário apressado – Que isso, ruim mesmo é ressaca que você não se lembra do
que fez no dia anterior...

Advogada – Para você isso é uma benção, te asseguro

( risadas altas são dadas por todos no lugar)

Secretária – Meu tio teve pedra no rim e disse que é a pior coisa que existe, ele cansou
de falar que preferia morrer a continuar com aquela dor.

Arquivista – Eu já tive um problema com um dente meu que tive que arrancar e pensava
a mesma coisa, cheguei a desmaiar de dor.

Faxineira – Vocês homens não agüentam nada, qualquer dorzinha saem por ai pedindo
pela mãe, se tivessem as dores de cabeça que nós temos não sei o que
fariam...

Funcionário apressado – Não é verdade, aqui mesmo a gente que faz o trabalho pesado,
tem que agüentar um monte de dor e você não vê a gente reclamando.

Secretária – É, mais a dor de cabeça e o estresse em falar com clientes fica com a gente.

Advogada – nem me fale em estresse e dor de cabeça...

Arquivista – E nem me fale em tendinite...

Funcionário que está se aposentando – Nem me fale em dor nas costas...
(todos começam a falar ao mesmo tempo de suas dores e de como
elas são ruins até que alguém decide interferir)

Segurança do prédio – Gente espera ai. O Sr.F ainda não disse nada, vamos deixa-lo
Falar. Sr.F, afinal para o senhor qual a pior dor que tem ?

Sr.F – A pior dor que existe é aquele que estamos sentindo no momento.

Faxineira – O senhor tem razão, sempre tem né – dá um tapa carinhoso nas costas
do Sr.F.

Todos mostram consentimento com a frase do Sr.F, até alguém se levantar e dizer:

Funcionário apressado(sorrindo) – Pronto... Sempre o Sr. F tentando acabar com a nossa
conversa, vamos embora pessoal! – e faz um sinal com o braço –

E todos saem do local, rindo, conversando sobre o mesmo assunto, ate que surja outra polêmica.

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Sr.F e a busca por um poema.

(ao som de Mack the Knife - Louis Armstrong )


Sr.F acordou no meio da noite injuriado há duas semanas ele tenta escrever um poema mas não consegue fazer mais do que duas linhas sem ficar insatisfeito.

Sr.F – Não adianta forçar a inspiração...Farei um poema sobre o que ? A natureza, um animal? Um sentimento, um amor não correspondido?

Sr.F então começa a olhar ao seu redor procurando algo.

Sr.F – O que me trará esta casa ? Uma cortina, uma margarida? Uma fotografia?

(Sr.F senta-se em sua cama e olha para seu lado) – Abajur...


Abajur...
O que dizer?
O que não dizer?
Acende meus lampejos.

Ilumina minha impaciência.

E a rima?
Já que verbos são,
ausentes nesta sílaba.
Belle de jour, Catherine, mon amour,
Allons enfants
Le jour de gloire est arrive

Com tua luz, me conforto.
Através dela, um alento e a segurança.
Na sua sombra surgem o mistério e a ilusão.
Em tua sombra gelada desconfio de mim mesmo.

Abajur, abajur
Objeto discreto e companheiro
Conversei contigo e criei uma poesia
Possessivo e bobo fui eu, que achei que a inspiração era minha..

Sr.F desliga sua inspiração e volta a dormir, agora, tranqüilo e aliviado.



Sobre o Texto:

Eu realmente estava com dificuldades de escrever algo e aconteceu comigo mais ou menos o que aconteceu com o Sr.F. Olhei para o abajur e saiu esse poema. Não é melhor poema já escrito mas serve pra mostrar que a inspiração para escrever algo pode vir das mais variadas formas, até na forma de um objeto inanimado, rs.

Link para o álbum que contém Mack the Knife do Louis Armstrong: The Definitive Collection

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Antropoformizar

(Ao som de Just My Imagination - Rolling Stones )



É sexta-feira, madrugada. Antes de ir dormir Sr.F liga a televisão, tenta achar algo para assistir:

Click

“... E assim o homem, como um tigre solitário vai à caça, à noite, à procura da fêmea...”

Click

“... A leoa, agora viúva, fica inconsolável e inconformada...”

Click

“... Rápido como uma lebre, o ladrão fugiu sem dar pistas...”

Click

“... São livres como pássaros para falarem o que bem entendem...”

Click

“... Forte e resistente, como um urso, hoje ele defende o título mundial dos pesos pesados!...”.

Click

“... Ai!

O que foi?

Esse gato traiçoeiro me arranhou...”

Click

“... Seeeegura peão!

Eu falei que este touro não prestava!

Ele derrubou nosso peão e ainda queria mais!

Eu falei que esse touro era de má índole senhoras e senhores! ..”

Click

“... E agora com vocês ele...Que toda tarde destila seu veneno como uma cobra impiedosa! Ele agora nos revelará todos os segredos das pessoas mais famosas do...”

Click

“... A raposa astuta...”.

Click

“... Teimoso como uma mula...”.

Click

“... A águia imponente...”.

Click

“... Transpirou feito um porco...”.

Click

“... O tubarão Assassino...”.

Click

“A natureza cruel...”.

Click

“Animalizar...

Click

O...

Click

“Homem...

Click

“Humanizar...

Click

“O...

Click

Animal

Click…Click…Click! Click! Click!

Off…

Sobre o texto:

Estranhamente essa palavra apesar de estar em varios livros não se encontra nos dicionários que procurei. An-tro-po-for-mi-zar....
Achei antropoformismo no mini Caldas Aulete e lá diz: Conceito e ação de atribuir a um campo da realidade formas e atributos humanos... Eu prefiro dizer que é uma tentativa de animalizar o homem e humanizar o animal algo que o globo repórter e programas do genero adoram fazer chegando ao cumulo de dizer que uma leoa fica viuva e etc... É o que muita gente tenta fazer com seus bichinhos de estimação lhes colocando roupinhas e até mesmo tentando lhe ensinar costumes nossos como andar de duas patas e apertar a campainha... Mas é que eles são tão fofinhos né? Bah...

Coloquei a música Just my imagination do Stones, que não tem nada a ver mas foi a música que eu estava ouvindo quando escrevi o texto, então segue o link para o álbum que contém essa música, original dos temptations: Some Girls

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Sr. F e a Solidão


(ao som de Solidão - Alceu Valença ou She's a mystery to me - Roy Orbison


Misteriosa garota

A solidão é fera a solidão devora

É amiga das horas, prima irmã do tempo...

Solidão

(alceu valença)

Sr. F está em uma festa, uma confraternização com seus colegas – a maioria gente do trabalho, a maioria Sr. F conhece apenas de vista. Seu melhor amigo ali é uma garrafa de whisky e este não o impede de adormecer num canto que parece ser o mais opaco do lugar.

Uma música gira na cabeça de Sr.F, tem uma rouca voz, gaita e violão, mas as palavras ele não consegue discernir. Eis que com as pálpebras lentamente abrindo Sr.F vê, no meio da multidão uma mulher toda de branco se aproximando. Anda mas parece flutuar longos cabelos negros, aspecto jovial, a pueril feição de quem tem algo importante a dizer.

Misteriosa garota ( assim Sr.F a chama) - Posso me sentar ?

Sr.F – mas claro, sinta-se a vontade.

Permita que eu lhe peça um drink?

M.G – Muito obrigada mas vou recusar. (olha para o lado e torna o olhar para F)

Você não percebeu, mas eu estava aqui o tempo todo e na verdade já

brindamos bastante esta noite. Nós e sua estimável garrafa de whisky.

Sr.F – Perdoa-me senhorita, mas por mais aturdido que eu pudesse estar, me lembraria

de tal presença

M.G – Você se engana. A maioria das pessoas, inclusive não quer me ver, procuram as

mais diversas formas de me, ou de se enganar para que isto não aconteça.

Sr.F – E o que a torna tão indesejável ?

M.G – O vazio, a sensação de não saber para onde ir, se fica, se corre, se fica, se vai...

Talvez, eu seja má....

Sr.F – E o que te tornas má ? O que faz as pessoas pensarem assim de ti?

M.G Sou amiga do tempo, colega do desespero, irmã do pesadelo e amante da

loucura. As pessoas querem distância de mim.

Sr.F - Vieste aqui para me buscar ?

É isso?

M.G - (gargalha estridentemente – Sr.F. olha para os lados como se envergonhado com

o fato, mas as pessoas não alteram o que estão fazendo. O que é motivo de

estranhamento para Sr.F. )

- Por que todos pensam assim? Não, não sou quem estas pensando.

Não venho te buscar, mas te acompanhar.

Sr.F – Isto muito me tranqüiliza mas ainda me assustas.

M.G – Pois não se assustes, não percebestes mas estou mais ao seu lado do que

qualquer outra pessoa que tu conheças.

Sr.F – Me confunde, o que significas ? Porque estas aqui?

M.G – (coloca lentamente a mão sobre a mão de F.) Você me enxergar é reconhecer. Tu

sabes lidar comigo, por isso estou aqui. Outras pessoas costumam me abominar,

fingem que não me vêem, não percebem que podem conviver comigo.

Sr.F – És...

M.G – Não! (grita, interrompendo bruscamente a F.) Não digas meu nome, senão me sentirei obrigada a partir.

Sr.F – Se és quem penso, eu não deveria estar só com minha garrafa de whisky ?

M.G – Como pode fazer tal observação ? Estou aqui ao seu lado e existem dezenas de

pessoas ao redor.

Sr.F – E não te notam.

M.G – Correto.

Não precisas estar sozinho para que eu apareça. Pode sentir minha presença, ou

me ver até mesmo em um estádio de futebol lotado.

Sr.F – E o quanto ruim pra mim é sua presença ?

M.G – Se te incomodo, já digo que é ruim.

Mas tu és quem tem de saber o seu limite do suportável.

Se já me reconheces, tem um problema a menos, aliás, não diria que sou um

problema, as vezes sou solução,

Às vezes começo, às vezes fim...

Não se desesperes se não tens ninguém a quem recorrer,

Sempre terás a mim.

Eu, fera, de braços abertos,

Fiel companheira,

Use-me como quiseres,

Minha ausência dá alivio,

A minha presença perturba o coração,

Sou eu,

A sólidão...

Sai de cena a misteriosa garota, Sr.F se retira do local e vai para casa.

Nunca mais tornou a vê-la.

Sobre o Texto

Bom, as musicas citadas acham que falam por si sobre o tema, eu nem tenho o que dizer.

Link para o álbuns em que estão essas músicas:

O melhor de Alceu Valença - Pelas ruas que andei - coletanea.

Mystery Gyrl - senha = bobophon - Álbum de 1989

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Poema do amigo que se perdeu

(ao som de Friends - Led Zeppelin )



Para mim tu morreste.

Se já não posso ouvir sua voz,

Se já não escuto mais os seus conselhos.

Para mim tu morreste.

E dói, mais do que a morte em si, dói.

Para mim tu morreste.

Seu telefone já não é o mesmo,

Se por seus cabelos já não mais te reconheço.

Para mim tu morreste.

È mais do que morrer, é torturar antes de matar.

Maldito seja este sangue frio que em sua veia corre.

Para mim tu morreste.

Não sei mais que presente dar.

Não me lembro o dia de confraternizar.

Para mim tu morreste.

Não pude ainda colocar aquela flor amarela,

Homenagem minha singela.

Vai ter de esperar e talvez nunca aconteça, pois não sei se serei noticiado.

Para mim tu morreste

Não há mais conversas ao pé do ouvido, Nem cochichos,

Não há mais soslaios que dizem mais que palavras,

Para mim tu morreste.

E se tivesse ido antes a mim teria sido mais fácil,

Pois assim saberia eu onde tu estas,

Pois assim deixaria contigo minhas incertezas, angustias alegrias,

Frustrações e sonhos.

Para mim tu morreste.

Que prazer ter te conhecido,

Sofrimento que valeu a pena,

Faria tudo de novo,

Fez minha vida valer mais a pena,

Poderia ter sido melhor, poderia ter sido pior,

Fui eu que te escolhi,

Se hoje lamento, você deveria então estar contente.

Para mim tu morreste.

Sobre o texto

Acho que todo mundo já passou por isso e vai entender do seu jeito particular.

Sobre a música citada: Friends - Do albúm Led Zeppelin III - Led Zeppelin - Link pro albúm = Led III

Outras músicas que podiam ser citadas: Canção da América - Milton Nascimento, My Friends do Red Hot Chilli Peppers e etc.

sábado, 17 de maio de 2008

Sr. F e o suicida

(Ao som de Behind Blue Eyes - The Who ou Nardis - Chet Baker ou ainda Nom, je ne regrette rien -de Edith Piaf.


01h36min da manhã, Sr.F está caminhando. Não tem pressa. A rua está tão

vazia que é possível ouvir os passos de F.; sapatos italianos pretos, bem

engraxados por ele mesmo dão o tom. Com as mãos no bolso e cantarolando

uma música de Edith Piaf Sr.F. se depara com um homem que está se

caminhando para a ponte que se aproxima.

Sr.F - Boa Noite

- Só se for para você, para mim é a última.

Sr. F (surpreso) – Caminhas para ponte porque queres tirar a própria vida ?

- Sim.

Sr.F – E por qual motivo queres fazer isso ?

Suicida – Preciso de um motivo?

Sr.F – Se precisas de um motivo para viver, precisas de um para querer o

suicídio.

Suicida (andando um pouco mais devagar) Não tenho ninguém que me prenda

aqui. Não tenho gosto pelos estudos e odeio minha profissão.

Sr.F – E a vida se resume a isso agora ?

Suicida – Acho que nunca terei mais do que tenho hoje.

Sr.F – Se prezas tanto tais coisas, acreditando que nunca poderá modificá-

las,só contribuirá para que isto se torne fato concreto.

Suicida – Já me iludi por muito tempo, não agüento mais sofrer.

Sr. F – Olha para sua vida mirando na de outros. E não poucas vezes se

enxerga como um derrotado. Mas afinal quem é o vitorioso? Quem fez

este modelo-pronto da vida perfeita será que verdadeiramente era feliz ?

Vou além... O que é ser feliz?

Suicida – Vou interpretar esta pergunta como uma retórica e vou abrir mão de

respondê-la...Eu só queria ter uma vida normal, ter uma

companheira, um filho, um cachorro fiel e um emprego que

preservasse minha dignidade.

Sr.F – Viu só...Talvez sofra porque este não seja seu desejo, é o desejo que

outras pessoas querem que você possua, se torna, assim, um desejo

artificial.

Suicida – O que diz faz sentido. Mas estou convencido que não pertenço a

este mundo, entretanto sou tão patético que nem tenho coragem de

cometer o suicídio.

Sr.F – Sabe que sinto dois sentimentos distintos nessa hora sobre você: pena

e admiração mas não consigo definir se você estas prestes a cometer

um ato de coragem ou de covardia, talvez seja um mistura dos dois.

Suicida – As pessoas geralmente consideram um ato de covardia e egoísmo,

talvez seja mesmo, mas, não me importo mais com o que as pessoas

dizem.

Sr.F – Se não se importasse, não estaria aqui a um passo de colocar ponto final

em sua vida, porque se sente um excluído na sociedade.

Suicida – (Ameaça dizer algo mas logo põe a cabeça para baixo e aperta mais

forte a pedra que carrega.)

Sr.F – (percebendo o gesto do suicida interpela-o) – Porque segura esta pedra ?

Não seria mais cômodo pegar uma quando chegasse mais perto da ponte?

Suicida – Sim, perto daqui não moro, aliás, quase nunca por aqui passo, mas

carregá-la me dá tempo para reavaliar minha idéia.

Sr.F – Vejo que ainda tem duvida sobre o que irá fazer. E carrega esta pedra

como se fosse um pagamento de seus pecados, mas esta prestes a

cometer um ato que é considerável abominável pela religião que você

provavelmente pertence.

Suicida – Deixei de praticar minha fé há tempos. Os sacerdotes dela sim,

abominam esse ato e condenam os que fazem ao pior lugar possível

que se pode ir após a morte. Mas também, dizem que Deus perdoa a

todos. Creio que este meu ato seja muito mais passível de perdão do

que muitos cometidos por estas pessoas que pregam tão falsa

moralidade.

Sr.F – Não tenho dúvidas sobre isso.

Eu o deixarei em paz agora.

Suicida – Não o preocupa o fato de que posso me matar, quando virar as

costas ?

Afinal, porque se preocupou comigo este tempo todo?

Sr.F – (sorrindo levemente) – Não vim aqui para demovê-lo de sua idéia.

Tentei entendê-lo, porque todo este tempo fiquei pensando como

seria se eu o tivesse conhecido antes, se fosse próximo a você como

receberia a noticia. Com surpresa? Com Naturalidade? Choraria?

Sequer me lembraria de você ? Iria ao seu enterro? E se fosse eu que

estivesse em sua posição, faria o mesmo ? ...

Não quero julga-lo e não vou falar que há pessoas em situação

piores que a sua mas que nem pensam no suicídio, porque considero

imensuráveis e intransferíveis as vontades, desejos, necessidades,

ambições e, principalmente, a relevância a cada fato da vida que

cada pessoa tem. Posso contestar, mas não posso dizer que seu

motivo para realizar o suicídio seja fútil, cabe a você este

julgamento.

O que posso dizer é que nenhuma pátria, nenhum ideal, nenhum

amor, nenhuma fortuna deveria valer mais do que a vida, da qual não

sabemos o que a sucede.

Sr.F recoloca as mão no bolso, ajeita seu chapéu e se põe ao seu caminho,

aquele estranho diz um humilde “obrigado”, que pela voz parece vir direto

do pulmão.

Sr.F nunca mais tornou a vê-lo.

Sobre as musicas citadas neste texto:

Behind Blue Eyes ( Do albúm Who's Next) - The Who: Musica que o guitarrista do grupo, Pete Townshend, dedicou ao vocalista Roger Daltrey que na epóca passava por muitos problemas devido a drogas e seu descontrole quase até o tirou dessa banda fabulosa. Atenção a bateria poderosa como sempre de Keith Moon. link para o albúm = Who's Next

Nardis (do Albúm I remember you) - Chet Baker: Baker foi um excelente trompetista que teve uma morte trágica em 1988, caiu da janela do hotel em que estava hospedado, há muita controversia se foi um suicidio ou acidente provocado pelo excesso de uso de drogas. Link para o albúm: I remember you - Parte 1 ; I remember you parte 2

Nom, je ne regrette rien - Edith Piaf: Sem comentários, apenas o link para o albúm coletânea): Very Best

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Diálogos entre o Sol e a Lua.

(Ao som de Under a Violet Moon - Blackmore´s Night, Here comes the sun – Beatles ou “Moon is up” – Rolling Stones)

Ao pé de um morro, sentado e encostado em uma jabuticabeira, Sr. F observa o seguinte diálogo que acontece no fim da tarde:

Sol (se pondo) – Até mais Dona Lua

Lua (se impondo) – Já fizeste seu trabalho hoje ?

Sol – Não posso te dar esta resposta. Cansado estou e sinceramente não me preocupo com isso.

Lua – Pois como pode descansar sem ter feito por completo suas obrigações ?

Sol - Não tenho obrigações.

Lua – Nota-se...

Sabe,Sol, estou preocupada.

Sol – O que te causa isto ?

Lua – Toda noite ouço reclamações de ti, que tu vens causando cada vez mais doenças, queimaduras, que estás cada vez mais esquentando e assim prejudicando a todos...

Sol – Creio humildemente que não posso responder por tais acusações.

Lua – Digo que tu és um egoísta.

Sol – E posso saber por quê?

Lua – Pois se não deixas que a chuva regue as plantas, alimentos. Pois se derretes a gelada moradia dos solitários amigos nosso do Norte. Pois se nem deixas que as pessoas olhem para ti por muito tempo! Ainda, causaste doenças e incômodos...

Sol – Eu...

Lua (interrompendo) – Tu não passas de uma estrela vaidosa e egoísta! Queres aparecer e brilhar cada vez mais forte, longevo, como se ninguém o conhecesse.

Sol – E como tu (enfatiza o Sol) te definirias?

Lua – (se infla e declama em voz alta) – Eu, eu sou um ser cintilante, inspirador. Os maiores poetas vi surgir, a mim é que recorriam. É comigo que casais perdem a vergonha e a pureza e ganham a intimidade. Não transmito doenças, curo, guio. Eu ilumino a solidão e a desigualdade, torno menos triste a noite de quem não ganhou a piedade. Transmito a paz e o sossego, peço...o silencio.

Sol – Se é assim, então me vou tranqüilo. Pois confesso que por um momento pensei em me reavaliar.

Lua – E o que te tranqüiliza?

Sol – Pelo que dizes.

Tua única preocupação é se mostrar bela, presente. Não tens que alimentar ninguém, não tens que acordar ninguém, não consegues iluminar sozinha uma cidade, ou uma casa sequer. Aposto que não sabes qual tua finalidade. Tu és triste. Inspira os solitários porque assim também és. Não queres ajudar ninguém, só que te notem e que façam algo. Tu és a verdadeira egoísta.

Agora me dê licença pois tenho de ir, amanhã tenho de irradiar ainda mais, pois se hoje aqueço mais é porque de mim assim exigem.

A Lua, cheia, mingua. Vira meia e torna seus ouvidos aos boêmios.

Sr. F volta para casa, não sem antes regar seus girassóis.


Obs* Texto inspirado numa conversa com minha amiga Bianca.

Tentem ouvir as musicas ao mesmo tempo que em que lêem os posts, pelo menos se o texto estiver ruim asseguro que as musicas são boas, rs...

Bom, aqui estão os links para baixar os álbuns das musicas que indiquei:

Under a violet moon (está no álbum homônimo de 1999) - Blackmore's Night.
Esta é a banda atual do ex-guitarrista do Deep Purple , Ritchie Blackmore, que se juntou a cantora Candice Night para fazer este som com elementos da música celta, é excelente, quem não conhece, baixa que vale muito a pena, garanto. Link - http://rapidshare.com/files/84781808/Blackmore_s_Night_-__1999__Under_a_Violet_Moon__192_kbps_.rar

Here Comes The Sun (do Albúm Abbey Road de 1969) - Beatles.
Musica cantada e composta por George Harrison a curiosidade é que Lennon não participou pois estava doente no dia da gravação da canção. George a gravou na mansão de Eric Clapton. Link: http://rapidshare.com/files/28259975/The_Beatles_-_Let_It_Be.rar.html

Moon Is Up (do album Voodoo Lounge de 1994 - Rolling Stones - Música pouca conhecida dos Stones, pouco cantada ao vivo, fica melhor com arranjo de gaita, mas não achei o link dessa, vai o do álbum: http://w10.easy-share.com/727475.html

Outras músicas que lembro com "tema" parecido, hummm...tem a Hole of the moon do Waterboys que é boa, o albúm inteiro do Dark side of the Moon, Good Day Sunshine dos Beatles e etc... Se lembrarem de mais alguma, por favor postem seus comentários, espero que tenham gostado das primeiras postagens.